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sábado, 4 de dezembro de 2010

Memória e preservação: uma conversa entre pares- Elias Salgado

Ontem, reencontrei um antigo companheiro de luta pela causa da cultura sefaradí, o doce amigo, Dr. Luiz Benyosef.
Nos conhecemos no final dos anos 90, no escritório de Alberto Nasser, levados nós e outros "sfatas" ( palavra formada pelas iniciais de sefaradís autênticos, em língua hebraica), pelo entusiasmo de Nelson Menda, para juntos fundarmos o CONFARAD e realizar, no Rio, o seu primeiro congresso.
Vem de lá minha admiração por este geofísico, pesquisador titular do Observatório Nacional, um antenado com o universo e amante incondicional das coisas e das causas humanas, em particular as judaico-sefaraditas.
Sempre apreciei em Benyosef, a simplicidade aristocrática de sua sapiência - um jeito "cool",  poderia dizer "kal", do hebraico - leve. Acho que é isso - uma sábia leveza de ser...
Posso dizer todas estas coisas sobre ele, para só depois lembrar, que como eu, é neto de tangerinos e também ama nossa ancestralidade e toda a sua tradição, mas se o fizesse primeiro, me julgariam suspeito, parcial, tendencioso...


Luiz Benyosef, no Encontro das Águas, em Manaus, em sua visita as comunidades da Amazônia


Por contingências diversas nos afastamos um pouco, mas jamais deixei de seguir suas pegadas...
Eu fui tratar da minha paixão deslavada pelo judaísmo amazônico e ele seguiu ativo no CONFARAD, além de fazer um trabalho brilhante como diretor de pequenas comunidades da FIERJ – e foi nesta nova missão, que Benyosef, em parceria com o saudoso casal Egon e Frieda Wolff de abençoada memória, “cometeu” sua, até aqui, na minha humilde opinião, maior contribuição à memória da presença judaica em terras fluminenses, a criação do Memorial Judaico de Vassouras, o qual preside.
 Para conhecer a dimensão e importância de tão magnífica obra, acesse www.memorialjudaico.org.br/.   E antecipamos que o UNIVERSO SEFARADÍ e a revista AMAZÔNIA JUDAICA, estão preparando uma matéria especial sobre o tema.
Mas voltemos ao nosso (re)encontro. Ele se deu na Adega Portugália, bem ali no tradicional Largo do Machado, outro lugar especial da memória do Rio e da minha pessoal.
Falamos sobre isso e também, é claro, da nossa paixão comum: a memória e sua preservação, rememorando nossas origens pessoais comuns de netos de judeus marroquinos oriundos de Sefarad (Espanha), com suas particularidades – ele mineiro, cujos avós marroquinos se estabeleceram na Bahia e eu amazonense, cujos avós de mesma origem, se estabeleceram no Amazonas. Quase nada em comum...E para agravar ainda mais, dois grandes contadores de “causos”. E eu, como sempre, não perco o hábito de roubar os causos narrados por outros e registrá-los como um fiel escriba.
Pois vamos à história em questão:
me contou Luiz, que em 1998, teve a felicidade de realizar seu sonho de voltar ao  local de origem de seus antepassados, o Marrocos. Narrou com o entusiasmo e a graça de contador que lhe é peculiar, a maravilhosa e emocionante experiência ali vivida, e selecionou, como um exímio pescador de ostras seleciona a melhor de suas pérolas, a seguinte passagem da viagem, como destaque.
Aconteceu, me contou, que estando em  Tanger de nossos avós, resolveu, entre várias visitas, conhecer a sinagoga da família Benatar, escolhendo como momento oportuno de  ali chegar, a hora da tefilá (oração).
Eu não sei vocês, caros leitores, mas eu, muitas vezes não sei o que pensar de certos acontecimentos , tipo aqueles que se assemelham a coisas quase inexplicáveis. Não que eu seja totalmente cético – não se esqueçam da minha ancestralidade espanhola, em cujo idioma há um dito bastante conhecido: “no creo en brujas, pero que las hay, las hay”... e mais ainda,  da minha vertente marroquina, cuja tradição, entre outros elementos centrais, possui uma forte crença no poder e nas façanhas de seus tzadikim(justos). E para agregar mais “pimenta” lembro da nossa literatura rabínica, o Talmud, que entre várias coisas afirma o seguinte: o mundo, a cada geração, se mantém de pé, graças à existência de 36 justos ocultos que justificam sua preservação.
Mas voltemos ao meu amigo Luiz e sua visita à sinagoga. Me contou que ao chegar naquele recinto sagrado, se deparou com nove homens que o receberam com um misto de euforia e surpresa de quem vê chegar, finalmente, alguém por quem ansiosamente esperavam: “ Oh. finalmente você chegou, já podemos começar, então”
Foi quando ele percebeu que era o décimo homem no lugar e que com ele podiam formar o minian (quorum mínimo para se rezar coletivamente).

Até aí nada demais, certo? Mas acontece que não chegou mais ninguém depois dele...

Luiz Benyosef, na Sinagoga da família Benatar em Tanger, durante sua viagem ao Marrocos em 1998

Um comentário:

  1. hahahaha!

    ótima história, Elias!

    “no creo en brujas, pero que las hay,las hay”...

    :)

    bjos,
    Flavinha

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